quarta-feira

Pele nas paredes

Escrevo, pois com a distância as coisas são muito mais seguras.
Levantei paredes ao meu redor e coloquei suas coisas em pequenas molduras.
Enchi o armário com suas cartas.
Preguei suas fotos na cabeceira da cama.
Envernizei a coisa toda, e agora você está fora de perigo.
Aqui você não envelhece.
Sua cara plastificada me comove.
Até me arranca um sorriso quando vejo que você não pode piscar.
Mas também me deixa triste quando percebo que suas cartas e fotos não podem me tocar.

Quando abro a janela, a única que tem, abro só pra ventilar.
Demorei anos pra juntar todas essas coisas...
Não posso reclamar da frieza.
Aqui seus cabelos continuarão castanhos mesmo quando forem brancos.
e seus olhos continuarão verdes, mesmo quando não existirem mais.

quinta-feira

Sonho pesado

Não importa quão suave seja o toque, despertar é sempre um ato brusco e inevitável.
A matéria endurece, o ar queima os pulmões, a luz explode nos olhos.
Você percebe, e sabe quando pára de sonhar.

É um ato diário.
Ás vezes lembramos de tudo que sonhamos.
Ás vezes a gente distorce os sonhos.
Ás vezes não lembramos de nada.

...Mas sonhar, a gente sonha sempre.